A arte de cozinhar; o local onde se faz Amor; fétiches, manias, rituais, gostos...

Não vejo muita TV mas tenho um ou outro programa de culto e um deles é o Entre Pratos (aos fins-de-semana na 2:); o Henrique Sá Pessoa com aquele jeitinho descontraído de bom anfitrião e um talento incrível para lidar com as panelas, tornando o acto elegante e fácil, fez crescer a minha vontade de tirar um curso de cozinha (velho sonho).

Verdade! Adorava ser uma "Henrique Sá Pessoa de saias". Ele representa tudo aquilo que penso do acto de cozinhar - criativo, inteligente, prático, além de saboroso e saudável, feito com amor, uma alquimia. E depois todo aquele que sabe cozinhar - e bem - ganha a afeição e admiração dos outros, verdade ou não?

Escusado dizer que adoro cozinhar (não significa que o faça bem, nem que saiba muito), desde que não por obrigação. Para mim tem que ser um acto tão prazeroso e solene como pintar, por exemplo. Não consigo fazê-lo de forma mundana, automatizada e despachada, sem rituais. Manias minhas, que hei-de eu fazer?
Por isso é que em casa (quase) nunca cozinho. Como no "poleiro" só há lugar para um "galo", ganha a minha mãe, por antiguidade (LOL) e cozinha ela, oras, pois no dia-a-dia o que o pessoal quer é ver a comida na mesa a tempo e horas.

Algumas manias/rituais meus:

• Quando entro na cozinha para fazer algo não posso ter hora marcada para terminar; tudo tem que discorrer a um ritmo quase musical, estilo Bossa Nova.
• Antes de começar a cozinhar tenho a mania de limpar todas as bancas; tenho que ter a cozinha impecável.
• Adoro utensílios de cozinha e tenho que ter um para cada função (é mesmo pelo gosto de os ter, pela estética deles). Os meus preferidos? Tábuas (de madeira), moinho de pimenta, moinho de café dos antigos (pelo design retro, nem que seja só para expor), kit de facas (diferentes tamanhos e laminas), bacias em inox ou acrílico (diferentes tamanhos) e utensílios de mexer nos alimentos todos em madeira (colher de pau, espátulas, etc).
• A minha cozinha será um misto de modernidade e design, com elementos rústicos e retros, ambiente funcional e familiar e um aspecto sempre muito asseado (sou fundamentalista quanto a isso).
• Adoro peças funcionais com design - espremedores de citrinos; escorredores de massa; copos, talheres de comer, os frigoríficos SMEG... - e outras mais rústicas como cestos para frutas frescas e frutos secos, tabuleiros de madeira com panos em linho, malgas de barro "caldo verde", ... - e misturá-las todas no mesmo ambiente; não gosto de objectos impessoais.
  
• Gostava que a minha (futura) cozinha tivesse um quadro ou uma parte da parede em ardósia preta, para conjugar o efeito estético com a vertente prática: podia aproveitá-la para escrever a receita do momento, recados, uma lista de compras, ou mesmo o pensamento do dia, etc...
• Adoro os pratos tradicionais portugueses, mas muitos são complicados e morosos de fazer; sou incapaz de passar horas de volta das panelas (no máximo dos máximos perco um hora a cozinhar algo). Por isso prefiro a cozinha de fusão e inventar muito, claro.
• Há alimentos/ingredientes que não dispenso ou que são fétiche para mim: alho, tomate, azeite, cogumelos, salsa, pimentas e outras especiarias, massas, arroz basmati (porque é rápido de cozer e dá para inventar formas de o cozer), ... Obrigatório nas refeições que faço: sopas e saladas.
• Sou incapaz de cozinhar ou arrumar a cozinha com alguém à minha beira ou presente; tenho que estar sozinha (foi este um dos aspectos que tornou inviável ocupar este "poleiro", lá em casa, com a minha mãe); são actos solitários, não gosto de os partilhar, pois também não gosto de ter de ouvir sugestões "porque é que não fazes assim? porque é que não pões isto ou aquilo? eu gosto mais assim, ou com um pouco mais disto ou daquilo"...
• sou muito perfeccionista a cozinhar - quando não invento ou dou um toque pessoal a algo que sei já cozinhar, sigo à risca uma receita;
• também sou muito arrumada a cozinhar; à medida que vou cozinhando vou lavando o que sujo, arrumando nos sítios os ingredientes, limpando as bancas, etc, de outra forma não o consigo fazer (a minha mãe já é o oposto); chega a hora de comer tem que estar tudo arrumado à minha volta (escusado será dizer que desarrumar ou sujar a minha cozinha é coisa para me tirar do sério...)
  
• Confesso, a cozinha (a par do WC), é a divisória da casa mais importante para mim - tem mesmo que estar a meu gosto, ser confortável e prática, harmoniosa, esteticamente criativa, muito pessoal; é, no fundo, o espelho da nossa personalidade e um local de culto, pois (para quem gosta de cozinhar) é também um dos sítios onde reproduz amor para os outros!